Vasco Futscher
Conjunto de cerâmicas.
As peças aqui apresentadas, no seu conjunto, parecem ter saído de uma escavação. Podemos tomá-las por evidências de uma civilização arcaica. Reconhecemos pequenos obeliscos, partes de colunas, volutas e capiteis. Aqui o pequeno assume uma dupla função – transfere, boicotando, a suposta função do monumento para a escala da mão. Poderíamos dizer que a escala da mão é o centro da posse. Faço meu aquilo que me abarca. A mão é o princípio de uma casa menor aberta a captar o mundo envolvente. Obeliscos e colunas erguem-se do chão marcando o eixo vertical no nosso horizonte – primeiro eixo civilizacional, anuncia a lei dos seres bípedes destinados a viver levantados, a não sucumbir às tentações da horizontalidade.
Na nossa humana condição, acompanhamos o desmoronar dos eixos, frágeis em equilíbrio, edificamos o que insiste em curvar.
A natureza é sempre em si própria curva – dizia Duns Escoto. Acompanhemos a inclinação ao olhar para estas peças.
A curvatura opera de vários modos, mesmo quando uma aparente verticalidade se anuncia: o seu primeiro sinal prende-se com o próprio material que se presta instantaneamente aos caprichos da mão. Modelar é encurvar. A mão, terminal do sistema nervoso e antena, simultaneamente, agarra a pasta informe imprimindo-lhe circunvalações, acumulações, marcas de dedos e acasos. Outras peças há em que a curvatura se anuncia através do eixo oblíquo. Dir-se-ía que estão a naufragar.
Quase todas as peças se erguem (e desmoronam) a partir de uma base. Aqui a base recorta a inclinação, situa os pequenos monumentos crustáceos, atribuindo a cada um o seu chão.
FRANCISCA CARVALHO